domingo, 24 de agosto de 2014

Ernest C. Colwell - A lei Colwell sobre Jo 1:1

Papiro 66 -Bodmer
Papiro 66 -Bodmer
Um dos problemas exegéticos que quase sempre nos deparamos está em Jo 1:1. Neste, temos a tradução da Sociedade Bíblica do Brasil que contrasta (na Cristologia) com a tradução da Sociedade Torre de Vigia, vejamos por um lado a tradução de Almeida: "No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus." Na tradução dos Testemunhas de Jeová (Torre de Vigia) o texto está assim: No princípio era Palavra e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era [um] deus." Já sabemos onde está o problema. João entende que Jesus é Deus ou um deus que não é Jeová? Quem conhece os Testemunhas de Jeová (TJ) sabe que este é um dos pontos cruciais da sua doutrina Unitarista, sobre o nome do Senhor e ainda sobre a negação da doutrina da Trindade.
 
Façamos justiça aos TJs, eles não negam que Jesus seja um deus, mas não é Jeová. Quando Ário levantou a doutrina seu principal ponto era: não negamos a Jesus, mas Ele é um ser criado, derivado e subalterno a Deus. O Arianismo se disseminou e hoje, uma das formas desse Arianismo, os TJ, traduzem a Bíblia como vimos acima.
 
Quero levantar aqui, um erudito americano que muito contribuiu para os estudos da "manuscriptologia", [também chamada de baixa crítica] chamado Ernest C. Colwell (1901-1974). Ele foi o fundador da Universidade de Chicago e descobriu e reconheceu algumas coisas que gostaríamos de destacar neste artigo e depois demonstraremos como o seu trabalho contribuiu para percebermos que a tradução dos TJ está equivocada.
 
Dentre vários trabalhos, Colwell reconheceu uma familiaridade textual extraordinária entre o Minúsculo 2427 e o Códex Vaticanus. Os Minúsculos eram Códices (cadernos ou livros), escritos em letra cursiva datados do VIII século em diante. Das muitas cópias em letra cursiva, o 2427 contém somente os Evangelhos e é datado do século XIV aproximadamente. Já o Códex Vaticanus é um Uncial (letras MAIUSCULAS, todos esses escritos em folhas de papel), datado do século IV e contem a Bíblia toda com exceção do Apocalipse. Os estudos de Colwell demonstraram que o Minúsculo 2427 preservou um "texto primitivo" do Evangelho de Marcos  chamado ("Archaic Mark"). Ele examinou o Minúsculo 330 do século XII (especialmente nas cartas paulinas) o qual é muito semelhante aos Minúsculos 451 (século XI); o 2400 e 2492 (século XVIII), trazendo grande andes informações sobre estes Mss.
 
Quando examinou o Papiro 66 (século II e III também chamado de P Bodmer, famoso nos trechos de João), o Códex Sinaiticus (século IV), o Códex Alexandrinus (século V) e o Códex Washitoniano (século V), descobriu um relacionamento entre eles e, sua conclusão foi que havia entre eles uma leitura singular e estreita. Em 1959, Colwell junto com outros desenvolveu um método de relacionamento entre as muitas testemunhas (MSS - Manuscritos) dentro do que entendemos com Criticismo do Novo Testamento. Este método é conhecido como Claremont Profile Method (Método do Perfil Claromontano). Este método explica o perfil dos MSS Minúsculos dentro da crítica neo-testamentária.
 
Depois dessa breve explicação voltemos ao nosso assunto de Jo 1:1 e a contribuição de Colwell a serviço da tradução. Isto é conhecido como a "Colwell´s rule" ou a “Lei de Colwell”.
 
Vamos enumerar o problema do grego:
Ἐν ἀρχῇ ἦν ὁ λόγος,
καὶ ὁ λόγος ἦν πρὸς τὸν θεόν,
καὶ θεὸς ἦν ὁ λόγος.
(Joh 1:1 BNT)
 
Há três frases em Jo 1:1 que muitos tradutores (leigos) tem dificuldades neste ponto. Todas as Bíblias (protestantes e católicas) entenderam o problema que se mostra assim: Na 1a frase temos literalmente: No princípio era o logos (Palavra). O Logos vem com artigo, definindo assim que o sujeito é a Palavra no Princípio de todas as coisas. Na segunda frase temos: e o logos estava com o Deus. Aqui, vê-se que novamente [e continuadamente] o sujeito é o Logos, mas nessa frase temos dois artigos definidos: o primeiro definido o Logos (ὁ ) e o segundo definindo Deus com uma preposição e artigo acusativo (πρὸς τὸν) com o que destaca Deus e a importância do Logos. Até aqui, entendemos muito bem, o texto é claro e de vital importância para o Cristianismo, mas a última frase temos um semitismo. Vamos ao texto: e Deus  (sem artigo) era a Palavra ou A Palavra era Deus.
 
Para muitos, este texto é um problema:
 
1) Porque Deus está sem artigo?
2) O que se faz numa frase quando temos dois substantivos, um com o artigo e outro não?
3) Quais as implicações disso? É relevante para a Cristologia Evangélica ou os TJs estão corretos?
 
Em primeiro lugar, Colwell percebeu que há traços de Semitismo no NT, especialmente nos escritos Joaninos. Não há tempo para falar sobre eles, mas precisamos descobrir porque o Evangelista não colocou artigo na 3a frase do verso 1 de João.
 
Vamos a Lei de Colwell:
Ele descobriu que o substantivo predicado que precede o verbo, usualmente não usa artigo. Um predicado nominal que precede o verbo não pode ser traduzido como um substantivo indefinido ou uma "qualidade" do substantivo somente por causa da ausência do artigo (anartro); Se o contexto sugerir que o predicado é definido, isto seria traduzido como um artigo definido do substantivo."
 
Em palavras menos técnicas, pode-se ver que quando há numa frase dois substantivos um com artigo e outro sem artigo (anartro), o substantivo articulado (com artigo) é o sujeito da frase, e o outro é o predicado nominal, ou predicativo do sujeito. Isto desmontra que a tradução da torre de Vigia gramaticalmente, está errada. Não há razão para rejeitar a frase: E o Logos era Deus, dentro do NT ela está correta. Ela é legitima dentro dos escritos do NT.
Desta forma, as nossas 3 perguntas acima foram respondidas, Deus está sem artigo porque esse é um traço do Semitismo Joanino e para destacar que o Logos é Deus; segundo, dois substantivos precisam ser vistos a luz da lei de Colwell e terceiro os impactos disto para a Cristologia são tremendos.
 
Encerro esse pequeno artigo levantando três coisas: primeiro a importância desse erudito e os seus estudos dentro da baixa crítica neotestamentária; segundo parabenizando os tradutores das Sociedades Bíblicas que não se deixaram seduzir pelo erro Ariano e terceiro sobre a importância em saber que a Bíblia afirma que Jesus Cristo é Deus, Ele é o Logos encarnado, foi levado a cruz pelos judeus e romanos porque ousou ser igual a Deus, o que para eles foi blasfêmia, para nós é motivo de louvor e amor!
 
Em Cristo Jesus, o Logos Eterno!
 
Fontes:
Aulas de Crítica Textual e exegese do Rev. Dr. Waldyr Carvalho Luz no Seminário Presbiteriano de Campinas;
Colwell, E. Cadman, A Definitive rule for the use of the article in the New Testament. Journal of Biblical Literature, 52 (1933): 12-21.
 
 




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